8 de junho de 2008

Graciliano














Retrato de Graciliano Ramos, Cândido Portinari

em tuas linhas
nunca tortas
mais que o agreste
ou a odisséia no sertão
teus cenários são
a humana condição

que está na ambição
pela terra
no cárcere da seca
no semear da fome
no desterro nordestino
na aridez da existência
palmilhada sob o sol a pino

neste panorama de letras
áspero e despojado
qual a caatinga
a beleza ainda vinga
seja numa cadela magrela
em celas da ditadura ou na
agrura por um periquito

e em meio às ossadas
angústias e seres
beirando o precipício
lapidar palavras
foi o teu ofício

3 de junho de 2008

como se fora Stradivarius









"Antonio Stradivari", de Edgar Bundy

nobre madeira
a da poesia
que merecedora se faz
do entalhe preciso
de quem cumpre
ser um artesão

uma vez luthier
entre palavras
mais que cravelhas
ou cordas
a ela dou o timbre
que melhor traduz
a emoção

funâmbulo na linha do Equador







"A Musa", de Pablo Picasso

a inspiração vem
a galope (Pégaso)
ou parte sem preâmbulos
incerto é seu tempo
de ir ou de chegar

uma arte o versejar
equilibrar palavras no
gume da navalha
conquanto sejam
elas fugidias
mesmo estando na
palma da nossa mão

music box












"Bailarina", de Andrew Atroshenko

têm surpresas
as caixas de música
em sua mecânica
e precisão

que o digam dedos
e corda
após em calculada
e maquinal luta
esgrimir:

quando não berceuse
uma chacona que se
soma à bailarina
no espelho a refletir

homem ao mar






"La pointe de la Heve, Sainte-adresse", de Claude Monet


é o poeta a ostra
sem o nácar iridescente
transmutando a dor
em pérola reluzente

2 de junho de 2008

Vulcano hodierno












"Vulcano forjando os raios de Júpiter", de Pierre Paul Rubens

bigorna, martelo
frágua e fole
golpeio frases
como cabe
a quem se pretende
um artesão

a poesia, forjo-a
em silêncio
quando a palavra
incandesce
e abrasa a emoção

pescando com Tarsila








"O Pescador", de Tarsila do Amaral



o horizonte em serra
litorâneos verdes e anis
ovaladas copas, casas sem
arquitetônica ousadia
e com a sétupla altivez coqueira
contrasta una a bananeira

pelo exercício do ofício
vem ao pescador enredada
a recompensa
e no reinado de Netuno
do peixe configura-se a captura
após azul espreita